Os Dias de Sempre

TERRA, HELENA
BESOUROS ABSTEMIOS

67,00

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Quando apareceu, em 2013, com “A condição indestrutível de ter sido”, Helena Terra já era uma escritora madura, inserida na melhor tradição da ficção introspectiva, aquela na qual o leitor recebe, de forma privilegiada, a confissão do narrador, estabelecendo vínculos de empatia, que, ao fim e ao cabo, espelha as nossas próprias expectativas e frustrações. Não é diferente o que nos oferece a história que vai contada neste novo romance, “Os dias de sempre”. Se, no livro de estreia, a autora expunha a conturbada paixão da protagonista por um homem casado, neste, agora, acompanhamos o depoimento de Mariana, uma mulher da alta classe média, em sua tentativa de compreender-se e compreender o universo no qual gravitam as pessoas que conformam sua existência. Com personagens desenhados com mão firme, complexos e profundos, Helena Terra lança luz, com maestria, sobre um recôndito raras vezes frequentado pela literatura, o das obscuras relações entre os que servem e os que são servidos dentro de uma sociedade desigual e desumana como a brasileira. Se o foco principal é a busca desesperada de Mariana por um leito de hospital para Nena, uma mulher que, “aos treze anos, com um buquezinho de flores na mão e uma trouxinha de pertences”, foi entregue à sua família para cuidar da casa, a narrativa se espraia e se agudiza em retornos e avanços no tempo, nos quais vamos reconhecendo a crônica do próprio país, principalmente a vocação escravocrata que persiste ainda hoje. Mariana tem consciência do lugar privilegiado em que habita, filha de um médico, Alberto, que ascendeu socialmente, e de Júlia, legítima representante da aristocracia rural gaúcha, nascida e criada numa cidade do interior, vivendo numa imensa moradia com seus irmãos, tratados ao longo de todo o livro como “os gêmeos” (sem nome, sem identidade própria). Assim, ela evoca o papel basilar de Nena no núcleo doméstico, que acompanha desde a constituição até a completa dissolução: “o que aconteceu há mais de uma década e antes e, também, depois dessa época, está no presente, como se todos os dias fossem o presente”, constata. Em Os dias de sempre, Helena Terra demonstra, de forma cabal, as imbricações inevitáveis entre memória pessoal e contexto político, numa reflexão necessária e urgente – justificando, assim, um lugar de destaque no cenário da literatura contemporânea. (Luiz Ruffato, escritor)