Serrote - Vol. 35-36

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"Depois de a edição impressa de julho ser substituída por uma edição digital gratuita, a nova publicação reúne os números 35 e 36 em um volume de 336 páginas. A revista apresenta os ensaios vencedores do 3o Concurso de Ensaísmo serrote, que teve como primeira colocada Maria Lucas, com o ensaio “Próteses de proteção”. Em 2o lugar, Evandro Cruz Silva, com o texto “Orfeu enfrenta o genocídio negro”, e, na terceira colocação, Raphael Grazziano, com o ensaio “Baltimore, ainda”. Maria Lucas (1989), também conhecida como Ma.Ma. Horn, reflete no ensaio “Próteses de proteção” sobre o lugar dos corpos trans na sociedade a partir de suas experiências durante a pandemia de covid-19. Para esses corpos, desde sempre em isolamento social, escreve a autora, as máscaras se tornaram um escudo a mais contra as múltiplas agressões da cisgeneridade tóxica. Lucas é multiartista, pesquisadora no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-Rio), mestra em artes da cena (ECO-UFRJ) e graduada em artes cênicas (PUC-RJ). No ensaio “Orfeu enfrenta o genocídio negro”, Evandro Cruz Silva (1992) aproxima o filme Orfeu negro, de Marcel Camus, e o livro clássico de Abdias Nascimento, O genocídio do negro brasileiro, numa releitura original que aponta futuros possíveis de um Brasil para além do racismo que o estrutura. Doutorando em ciências sociais pela Unicamp, escritor e educador popular, Silva pesquisa relações entre segurança, violência e desigualdades no Brasil urbano. “Baltimore, ainda”, ensaio de Raphael Grazziano (1988), investiga o modelo de revitalização das cidades, desigual e excludente, que foi engendrado nos EUA dos anos 1970 e replicado nas décadas seguintes ao redor do mundo, inclusive no Brasil. Formado em arquitetura e filosofia pela USP, na qual também realizou seu doutorado, Grazziano é pesquisador em teoria da arquitetura e do urbanismo contemporâneos. A serrote antecipa com exclusividade um trecho de Afropessimismo, novo livro do escritor, cineasta e ativista Frank. B. Wilderson III (1976), que sai no Brasil em 2021 pela. Mesclando ensaio pessoal e teoria crítica, Wilderson argumenta que uma agenda negra radical apavora a maior parte da esquerda porque emana de um sofrimento para o qual não há reparação ou nção imagináveis. Depois do assassinato de George Floyd pela polícia na cidade de Minneapolis (EUA), em maio, a poeta americana Elizabeth Alexander (1962) publicou na New Yorker o ensaio “Geração Trayvon”. O texto é dedicado aos jovens negros que, como os filhos dela, cresceram em meio à repetição massacrante de cenas e relatos de violência policial contra pessoas negras.É impossível entender e combater o racismo nos EUA sem examinar o persistente sistema hierárquico que o sustenta, diz a jornalista Isabel Wilkerson (1961) em seu novo livro, o premiado Casta: a origem de nossos males, que será publicado no Brasil pela Zahar em 2021. A serrote traz com exclusividade um trecho da obra, em que a autora compara a opressão contra as pessoas negras em seu país com o tratamento dado às castas inferiores na Índia. “A vida pulsante das periferias”, da escritora e pesquisadora Juliana Borges (1982) defende que o clichê de “senzala” não cola mais em quilombos urbanos que, sem pedir permissão, afirmam modos próprios de viver, ver, sentir, encarar desafios e construir soluções originais e potentes. Cria da periferia de São Paulo, Borges é autora dos livros Encarceramento em massa e Prisões: espelhos de nós.No ensaio “Estrangeiro em dois mundos”, Thiago Amparo repassa seu período entre Budapeste e São Paulo, quando testemunhou a ascensão dos governos autoritários de Viktor Orbán e Jair Bolsonaro, e concluiu que a democracia depende dos laços de afeto que tecemos. Em “Contra o cristofascismo”, o teólogo, ativista e escritor Ronilso Pacheco (1976) discute a presença de evangélicos na política brasileira e desmonta a tese da “cristofobia” aventada por líderes conservadores. Pacheco defende que a Teologia Negra pode ajudar a dissociar os evangélicos do retrocesso com que são identificados pelas alianças de parte de seus líderes com a extrema direita. Em “O gênero queer”, o ensaísta americano David Lazar (1957) mostra que, de Montaigne a James Baldwin, de Virginia Woolf a Roland Barthes, o desejo e a força do ensaio estão na transgressão de classificações e binarismos. A experiência feminina está no centro dos romances e ensaios de Rachel Cusk (1967), autora canadense que ganhou reconhecimento internacional pela trilogia Esboço, Trânsito e Kudos. No ensaio “Retratos da insubmissão”, Cusk discute como as artistas britânicas Celia Paul e Cecily Brown dramatizam em suas vidas e em suas telas a acidentada afirmação de mulheres pintoras num meio historicamente dominado por homens. Em “Diante da solidão de Clarice”, a escritora Ana Maria Machado (1941) relembra o dia em que, há 45 anos, Clarice Lispector pediu ajuda a ela para ordenar o caos que daria origem à obra-prima A hora da estrela (1977). O ensaio é ilustrado com manuscritos do acervo de Clarice, que está sob a guarda do Instituto Moreira Salles.O poeta Eucanaã Ferraz (1961) investiga, em “Construir de portas abertas”, um aspecto pouco explorado da obra de João Cabral de Melo Neto, que completaria 100 anos em 2020: sua relação tensa e conflituosa com o trabalho do arquiteto e urbanista Le Corbusier. Em “Os inimigos da livre expressão”, o jornalista americano George Packer (1960) diz que a pressão pelo pertencimento a grupos e causas enfraquece o compromisso de escritores e editores em contrariar ideias bem estabelecidas. O ensaio foi extraído do discurso de agradecimento ao Hitchens Prize concedido em 2019 ao autor de Desagregação: por dentro de uma nova América. Um dos grandes poetas do século 20, W.H. Auden (1907-1973) presta uma bem-humorada homenagem a um de seus poetas preferidos no ensaio “O povo contra o falecido sr. William Butler Yeats”. No ensaio “Proust, gado d+”, o jornalista Victor Calcagno (1994) investiga como o sofrimento do amor não correspondido, que nutriu a obra-prima ""Em busca do tempo perdido"", reverbera na subcultura dos memes, confundindo-se com o ódio misógino das s. Esta edição publica, na íntegra, um livro do poeta e ensaísta português Alberto Pimenta (1937), um dos maiores escritores portugueses de nosso tempo, conhecido por seu humor ferino, vasta erudição e permanente insubordinação. No inclassificável “Discurso sobre o filho-da-puta”, Pimenta reúne um bestiário das variadas encarnações deste infame personagem na vida pública e na convivência privada. Professora de direito da Universidade Federal de Uberlândia, Luciana Silva Reis (1987) participa da seção “alfabeto serrote” com o verbete “Cancelamento”. A pesquisadora levanta a história do termo e discute os excessos de seu uso no debate público atual: “A qualificação de qualquer crítica pública como ‘cancelamento’ levou a uma identificação entre as próprias ações: criticar em público equivaleria a cancelar”. A serrote #35-36 apresenta ainda dois ensaios visuais dos artistas Mulambo¨, que também assina a capa da revista, e Rivane Neuenschwander. A publicação também tem obras de Maíra Barillo, Abdias Nascimento, Bianca Leite, Rebeca Ramos, Lynette Yiadom-Boakye, Titus Kaphar, Le Corbusier, Cecily Brown e Celia Paul, Daniel Trench, Matheus Jadejishi, Gerty Saruê e Loredano."
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